foste buscar-me depois de 15 dias de férias, sozinha na colónia. era uma manhã
quente, muito quente, de final de Agosto. entrámos no autocarro e deste-me
aquela que na altura era a melhor de todas as notícias: “o pai já tem um
coração novo”. fiquei tão feliz, mas também um bocadinho sentida por me teres
deixado gozar as férias alegremente sem me teres contado, sem me teres deixado
estar presente… senti culpa, até. mas estas operações são assim, pensei… acontecem
quando menos se espera, quase sempre nas férias de verão (a ironia dos muitos
acidentes nas estradas que matam uns e salvam outros!), já o sabia na altura. hoje
sei – porque foi uma reflexão natural depois de ser mãe – no quão difícil
para ti foi calar o sofrimento, engolir o medo e fingir esperança, quando já
sabias que aquele coração novo tinha chegado demasiado tarde… imagino-te a
ensaiar aquela frase vezes e vezes sem conta… e consigo palpar a tua dor, hoje
que sou filha-mãe. mas também consigo palpar o amor, daquele incondicional,
como só as mães têm para com os filhos e a que nada no universo se compara.
mãe, desculpa lembrar-me(te) disto num dia em que celebramos a vida, a tua vida. mas é só porque são momentos destes que mostram a fibra de que és feita. aos 65 anos, a vida ainda te reserva muitas surpresas (boas!), tenho a certeza. agarra-as com essa tua força e sê sempre feliz. gosto muito de ti.
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