domingo, 13 de novembro de 2011

A cor do dinheiro

Há já uns bons anos, no meio de uma discussão acesa sobre economia, crises e afins, disseram-me: "Não acredites nos que tentam convencer-te de que não há alternativa ao modelo actual. Não aceites o que te impõem só porque não és capaz de propôr uma alternativa." Não terão sido exactamente estas as palavras, mas o conteúdo está lá. Na altura, reconheço, achei bonito, mas a minha ignorância levou-me a acreditar  que era conversa de idealista porque não via alternativa ao actual modelo económico.

Desde essa conversa, não fiquei menos ignorante, infelizmente, mas comecei a olhar para as coisas de outra forma. Comecei a questionar, a tentar perceber um bocadinho melhor aquilo que nos impõem todos os dias e que todos os dias também se revela ser uma valente bosta. O resultado é que comecei a sentir-me espartilhada numa impotência muitas vezes dolorosa: os bancos, a economia em geral, aquilo que nos dão para comer e as embalagens que nos impõem para tudo, os frigoríficos que são produzidos para avariarem ao fim de cinco anos e não terem arranjo, os políticos aldrabões, a dependência retorcida criada pelos programas de "ajuda" aos agricultores ou aos países mais desfavorecidos, a roupa e afins feita em fábricas que exploram os trabalhadores... e podia continuar até o Blogger me bloquear a conta. 

Isto tudo para contar que ontem li um artigo que pela primeira vez deu voz na perfeição a isto que sinto: "O dinheiro tornou-se obsoleto?", do Anselm Jappe, um filósofo alemão, na revista Atual do Expresso. Questiona o papel do dinheiro na sociedade e coloca-nos perante o cenário de uma sociedade não assente no lucro e no poder económico. Eu bem sei que é mais fácil fechar os olhos e não pensar nestas coisas. Mas depois um dia há alguém ou alguma coisa que faz um clique dentro de nós e a partir daí é difícil continuar a aceitar o que nos impõem como verdades universais. E este artigo tem capacidade para provocar esse efeito em muito boa gente, por isso só me apetece imprimi-lo em milhões de folhetos e espalhálo pelo mundo inteiro. Infelizmente isso seria pouco ecológico e não consigo publicá-lo aqui porque só está disponível online para assinaturas, mas deixo umas passagens que espero que abram o apetite e vos levem a procurar o artigo na íntegra.

"A produtividade de todos os sectores aumenta continuamente, as superfícies cultiváveis da Terra poderiam alimentar toda a população do globo, as oficinas e fábricam produzem até muito mais do que é necessário, desejável e sustentável. As misérias do mundo não se devem, como na Idade Média, a catástrofes naturais, mas a uma espécie de feitiço que separa os homens dos seus produtos. O que já não funciona é o interface que se coloca entre os humanos e o que eles produzem: o dinheiro. (...) A crise confronta-nos com o paradoxo fundador da sociedade capitalista: a produção dos bens e serviços não é para ela um objectivo, mas apenas um meio. O único objectivo é a multiplicação do dinheiro, é investir um euro para conseguir dois."  

"A verdade é bem mais trágica: se os bancos sucumbem, se vão à falência em cadeia, se param de distribuir dinheiro, arriscamo-nos todos a sucumbir com eles porque há muito tempo que nos retiraram a possibilidade de viver de outra maneira que não seja gastando dinheiro. É bom reaprendê-lo - mas quem sabe a que preço isso irá acontecer!"

3 comentários:

Kiki - Família de 3 e 1/2 disse...

Nem mais!!! O único problema agora, era aprender a viver daquilo que a terra nos dá... Com o conforto a que estamos habituados! :P

Melancia disse...

tão verdade! E como reverter anos e anos de "maus caminhos"?

Rita Maria disse...

Muito bom, vou ver se encontro o resto!