Há qualquer coisa que não sei bem explicar que só senti naquele país. A sensação de sermos transparentes, de estarmos a pairar, a observar tudo como se fosse o nosso primeiro dia na terra.
No Japão tudo é diferente: as pessoas, os sítios os hábitos. Os neons, as passadeiras diagonais intermináveis que desenham os cruzamentos, as cores que gritam em todo o lado, o olhar das pessoas, aquelas viagens de metro que davam material para escrever estudos sociológicos interminaveis. Sempre a dormir. Sempre. De pé, sentados, encostados, sempre a dormir. E depois aquela sensação estranha do barulho de fundo constante da publicidade em todo o lado. Será que é por isso que eles não falam?
As pessoas, quase sempre sozinhas. E as mulheres, bonitas, distantes, frágeis, sempre elegantes e de espelho na mão. Todas vestidas de igual, todas de louis vuitton no braço e joelhos para dentro. E os rapazes, ainda mais fashion victim que elas, arrojados, diferentes, com bom gosto. Os cabelos pintados. Os casais de cabelo pintado de igual. Mas todos com a mesma expressão: nenhuma. Aqueles olhos. E a dúvida constante: somos nós que temos os olhos redondos ou eles que têm os olhos em bico? E em que é que aquela gente pensa naquele silêncio?
E a ordem. Na rua, no metro, nos templos, nas máscaras na boca para nos protegerem dos seus vírus e não para se protegerem da poluição dos outros.
O sushi no mercado de peixe às 11h da manhã. O arroz e os legumes ao pequeno almoço. Desmontar a cama de manhã e montá-la à noite. E repetir tudo no dia seguinte. Os banhos quentes. Os banhos, os banhos, os banhos.
E o respeito, a subserviência. O sorriso até quando entornamos uma malga de miso no balcão do restaurante e obrigamos toda a gente a levantar-se para limpar a porcaria que fizemos. Arigatô gozaimassss. E inclina a cabeça. O olhar curioso dos mais novos e o ar condescendente dos mais velhos.
E no meio disto tudo a obsessão com o ocidente, as marcas, o look, os cafés, tudo o que não é japonês, mas até isso é japonês.
A língua, sempre cantada, sempre suave, baixinho, a vontade de agarrar as palavras e dissecá-las, e guardá-las e não as esquecer e acordar no dia a seguir a falar japonês.
E aquela solidão, a vontade de mergulhar naquele mundo apesar da certeza de que não suportaria a solidão.
5 comentários:
Gostei muito deste relato. É um olhar muito profundo sobre uma cultura que nos é tão distante e por isso tão atractiva.
O registo da solidão deixou-me um nó na garganta... Ser só no meio de tanta gente...
Gostei muito, mesmo!
Apesar do belo relato, num belo texto, com um belo contagiar de palavras...não me levem a mal, mas...o Japão não me atrai!!! Talvez um dia...
Hein, a cinzenta Bruxelas até tem outro encanto depois da descrição da solidão abismal que se sente no país do sol nascente.
(olha, rimei!)
Será que os japonezinhos tb tiram macacos do nariz qd vão a conduzir? Tinham conduzir a bicla só com uma mão, o que é difícil convenhamos...
Foste cuscada!
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